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40 anos: Flamengo 3 x 2 Atlético Mineiro, BR-80

A polêmica partida decisiva do Brasileirão. Neste primeiro dia de junho completa 40 anos da primeira conquista nacional do Flamengo, e de mais uma das tantas partidas em que o Atlético tem razão de reclamar da arbitragem.]

Mas venceu o melhor time. A base da melhor equipe que eu veria  na vida no Brasil: o Flamengo de 1981-82. Tema do livro que esvcrevi com ANDRÉ ROCHA, editado pela Maquinária. O livro oficial do clube lançado em 2011. 

De onde tiro o texto abaixo.

Nunes, o nome da decisão do BR-80
Nunes, o nome da decisão do BR-80

Por Mauro Beting

Só a vitória daria título ao Flamengo. Mas “só” vencer o Atlético não era fácil. “Tínhamos a obrigação de ganhar em casa. Eu enxergava o nervosismo em cada um de nós antes de entrar em campo”, conta o lateral-esquerdo Júnior. O paulista José de Assis Aragão ganhou o sorteio para apitar o clássico jogado com 27 graus no outono carioca. Maracanã com 154.550 pessoas ansiosas pelo retornos de Júlio César à ponta-esquerda e, principalmente, de Zico. Toninho também voltou para a lateral-direita, e Manguito substituiu Rondinelli, com o maxilar fraturado no Mineirão.

A renda foi recorde: 19 milhões e 726 mil cruzeiros.

Aragão não deixou o vale-tudo do Mineirão se repetir. Com menos de 2 minutos, Tita entrou feio em Jorge Valença; cartão amarelo. Se o árbitro começava melhor que Romualdo Arppi Filho para conter os ânimos, o Flamengo também era outro. Mais ofensivo e aceso. Mas um erro de saída de bola de Carpegiani quase deu em gol de Palhinha. Nada que erro ainda maior de Osmar Guarnelli não iniciasse o lance do primeiro gol: o zagueiro atleticano se lançou ao ataque de modo atabalhoado e desnecessário. A bola quicou à frente dele até o desarme habitual de Andrade, que tocou rapidamente a Zico, que virou rápido às costas descobertas de Osmar e do lateral-direito Orlando. Nunes recebeu como gostava, pela esquerda, e rolou na saída precipitada do goleiro João Leite, que estava fora da área se atirando aos pés do artilheiro que começava a fazer a fama de ser seminal na hora decisiva. A bola entrou mansa no meio do gol.

Aos 6 minutos, começava uma das mais sensacionais finais de Brasileirão. Na saída de bola, Toninho Cerezo avançou pela esquerda e criou o lance para Reinaldo, no meio de três, matar Raul e empatar. Enervando o Flamengo que errava passes e só acertava pancadas, como a segunda de Tita em Valença. Aragão não mostrou o amarelo, mas parava o jogo até por olhada feia.

O Galo era mais perigoso no contragolpe e tinha mais chances. Zico começou a recuar para tentar armar um time nervoso e que errava passes. Lento e dispersivo, Carpegiani não se achava, e o Flamengo se perdia. Júnior dava raça pela esquerda, mas o jogo não fluía. Em quatro minutos, dois cartões justos para Cerezo e Chicão, pendurando os marcadores atleticanos. O Flamengo melhorava. Éder recuava bastante para tentar lançar Pedrinho na direita nas costas de Júnior, que avançava muito para combinar com Júlio César as melhores jogadas pela esquerda.

Irreconhecível, Carpegiani errou feio e Júnior salvou num bico de pé esquerdo, aos 31. Aos 35, outro erro dele quase deu em gol de Éder. “Bah! Não joguei nada aquele dia! Prefiro esquecer aquela partida. Fui horrível. Quase dei um de graça para eles. Um horror!”, lembra hoje Carpegiani. Logo depois, a torcida começou a pedir Adílio para armar um Flamengo que perdera o pique. O Galo melhorava, mas era punido em duas faltas disciplinares.

A punição maior viria aos 44. Bola cruzada na área, Nunes dividiu com João Leite. O rebote sobrou para Júnior chutar, o rebote voltar para o lateral bater novamente para dentro da área. Na carambolada de pinball, quase caído, Zico dominou e mandou no ângulo de João Leite. O Flamengo ainda comemorava o segundo gol quando quase cedeu outro empate. Reinaldo desperdiçou a chance. Logo depois, como era praxe na época, sem o acréscimo devido, o primeiro tempo acabou com o título aos pés rubro-negros.

No vestiário, Coutinho leu uma carta para a equipe: era de Rondinelli. Escrita no hospital, com o maxilar preso por arames e parafusos. O "Deus da Raça" exortava: "Vamos pra cabeça, companheiros!"

Foram de corpo e alma. E algumas armas. O segundo tempo começou com as chuteiras ensarilhadas. Aos 23 segundos, Júnior e Chicão entraram para rachar. O lateral deu um totó no atleticano caído e recebeu merecido amarelo. Era com o lateral e Júlio César que o Flamengo ganhava a maioria dos lances em cima de Silvestre, que substituíra o lesionado Orlando. Uma terceira falta disciplinar foi marcada contra Jorge Valença.

Luisinho começava a puxar a perna direita. Aos 10, não teve como continuar. O titular da Seleção era sacado para a entrada do jovem lateral-direito Geraldo. Silvestre voltava para a zaga, pela esquerda. O Atlético já havia feito as duas alterações por lesão. E teria mais uma contusão para lamentar no minuto seguinte, quando Reinaldo sentiu fisgada na parte posterior da coxa direita numa corrida contra Marinho. O Maracanã celebrou como se o craque tivesse sido expulso. O médico Neylor Lasmar o fez voltar rapidamente para campo. Mas sem condição.

“Bichado” era o coro rubro-negro. O título estava mais próximo. Eram apenas duas alterações pela regra de então. O Flamengo pareceu relaxar. Zico deu uma senhora bronca em Júlio César, que não voltou para marcar no meio, aos 14. O ponta entendeu o chamado:

- O Zico era assim. Por isso virou o que é. Ele queria ganhar totó, pingue-pongue. Tudo. Exigia dele e de todos. Quando estava feliz antes do jogo, sabíamos que teríamos bicho para gastar. Quando a coisa estava difícil, ele fazia qualquer coisa para mudar a sorte. Teve um jogo que ele não estava bem. Chegou no vestiário, trocou toda a roupa, e daí deslanchou. Em muitas cobranças de falta, assim que ele batia na bola, o Zico ficava narrando o lance, e fazia até barulho da torcida com o gol que, de fato, acabava saindo. Ele realmente cantava o jogo. Tinha razão quando dava bronca na gente. Ele sabia tudo de bola.

Ainda tinha muito jogo. E um senhor rival pela frente. Além de um Reinaldo que jogava mesmo com uma perna. Aos 20, Éder cruzou com efeito da esquerda, Marinho se atrapalhou ao subir, e Reinaldo bateu de bate-pronto para empatar e emudecer o Maracanã. Mas não Aragão. E nem Reinaldo. O árbitro paulista pediu para o artilheiro deixar o campo. Sem se saber o porquê, talvez pela celebração exagerada.

Adílio entrou aos 22, enfim, no lugar de Carpegiani, que reclamou com o próprio time - com razão: “Estava 2 a 1 pra nós… Não era para todo mundo se mandar para o ataque…” O Galo respondia bem e só foi parado por um erro do bandeirinha gaúcho Carlos Rosa Martins, que anotou impedimento absurdo de Reinaldo, aos 23. O Flamengo foi dar a saída de jogo e Reinaldo se colocou à frente da bola, retardando o reinício. Ainda deu um bico nela. Como ele já estava amarelado, a expulsão foi correta. Mas outras indisciplinas e jogadas mais violentas haviam passado batido. Só Reinaldo foi punido com rigor.

O treinador Procópio Cardoso invadiu o campo gritando que era uma “covardia”. Ele também foi expulso. Não só ele: também o médico e o massagista atleticanos. Reinaldo deixou o gramado com o braço direito erguido em protesto, marca registrada para celebrar seus tantos gols e ainda protestar contra a ditadura que, naquele 1980, começava a ser abrandada.

Depois de seis minutos de interrupção, o jogo recomeçou. O Flamengo tinha um a mais em campo, mas não no placar. Precisava da vitória em 90 minutos. Só não podia dar os espaços que deu. Aos 30, Raul evitou a virada mineira, dividindo bola com Pedrinho na intermediária.

Nunes caía pelos flancos, mas ninguém aparecia na área. Nem Zico. Tita circulava mais e abria o corredor para Toninho. Adílio entrara bem. Júlio César partia para cima, e criava bons lances. O Maracanã seguia em silêncio e nervoso como o Flamengo. O lateral Geraldo errava quase tudo, mas Cerezo jogava por todos os atleticanos. Só não conseguiu controlar outra inexplicável saída de Osmar para o ataque. O Galo com o placar nos pés, um jogador a menos, e o zagueiro partiu para o ataque, aos 36. Tentou lançar Pedrinho na direita, mas perdeu a bola, já no campo rival. Júnior retomou e tocou para Andrade, que lançou Nunes aberto à esquerda, para cima de Silvestre, que teve de cobrir Osmar. O inexperiente Geraldo foi fazer a zaga central desguarnecida por Osmar. Nunes tentou cruzar a bola que bateu no peito de Silvestre. Voltou para o João Danado. Nunes fingiu que cruzaria de novo, saiu pela esquerda e bateu. João Leite caiu antes, sem esboçar reação. Nunes de novo devolvia o placar ao Flamengo, e o título à Gávea.

Mas ainda havia jogo. Coutinho sacou Júlio César, que atuava na base do sacrifício, e colocou o lateral Carlos Alberto apenas para marcar Cerezo. Nunes ficou à frente. Tita, Zico e Adílio fizeram uma linha de três armadores, com Andrade e Carlos Alberto como volantes. Para conquistar o seu primeiro Brasileiro, o Flamengo terminou o clássico no 4-2-3-1. Os números das grandes conquistas de 1981-82.

O jogo ficou ainda mais pegado. Não faltaram tapas e tocos não vistos pela arbitragem. Ou vistos até demais. Até uma bolada proposital de Chicão na cabeça de Aragão. Quando o árbitro foi pedir explicação, o volante, na cara de pau, disse que nada acontecera… No minuto seguinte, Chicão também pediu desculpas a Tita, que fizera graça na lateral, dando balãozinho, e recebeu um chutão do atleticano. Enfim o vermelho esperado. Sem desculpas.

Palhinha foi em direção ao árbitro, pedindo (exigindo) a própria expulsão. Aragão estava com o braço erguido e nem precisou baixá-lo para expulsar o meia do Galo. Antes disso, Palhinha chutara a bola em direção ao árbitro. Mas errara o alvo.

Apenas aos 50 minutos o jogo recomeçou, com a célebre versão brasileira da canção mexicana “Cielito Lindo”, o “Ai, ai, ai, tá chegando a hora…”. Mas quase chegou a hora do apocalipse, antecipando em 25 anos a Batalha dos Aflitos, da Série B, de 2005, entre Náutico e Grêmio. O Galo tinha apenas oito atletas em campo, faltando segundos para o fim do jogo. Carlos Alberto recuou para Manguito, que deu mal a bola para trás para Raul. O goleiro teve de sair fora da área, foi driblado por Pedrinho, mas, Andrade, como já havia feito duas vezes no Mineirão, salvou de carrinho para evitar que oito atleticanos vencessem 11 rubro-negros no gramado, e mais 150 mil nas arquibancadas.

Manguito era uma das surpresas na final. E quase virou algoz:

- O Coutinho fazia um revezamento no banco. Sem o Rondinelli, o jogo final no Maracanã seria do Nelson. Na sexta-feira, eu estava tomando minha cerveja em casa quando me chamaram para ser titular na final contra o Atlético! Só faltou eu ler a Bíblia para me concentrar! Quase que entrego o ouro no fim do jogo. Mas, rapaz, aquela não era uma bola para mim, não. Não tinham de ter jogado ela comigo [risos]. Eu não sabia fazer isso!

Ainda faltavam mais dois minutos de acréscimo. Mas a arbitragem não apenas não coibia a batalha campal. Não se atentava ao relógio. Era praxe. O jogo acabou antes do tempo. Iniciava ali um novo tempo no futebol carioca, brasileiro, sul-americano e mundial.

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