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Espanha campeã mundial em 2010 - a fúria é roja, capítulo 1

Vamos recontar a campanha campeã mundial há 10 anos

Andrés Iniesta fez o gol do título mundial espanhol há 10 anos, na África do Sul, dedicando ao amigo Jarque, então recém falecido
Andrés Iniesta fez o gol do título mundial espanhol há 10 anos, na África do Sul, dedicando ao amigo Jarque, então recém falecido

Por Mauro Beting

A Espanha enfim jogou como nunca e venceu como nunca uma Copa do Mundo. Encerrando anos de fissura nacional e desconfiança mundial que geraram uma frase que parecia lápide das pretensões planetárias da seleção espanhola. Ironia do destino para o futebol mais vezes campeão de clubes na Europa (ao lado do italiano).

A frase batida e surrada fica melhor em espanhol que a tradução livre: “Jugamos como nunca, perdimos como siempre”. É usada indistintamente por mexicanos, hondurenhos, paraguaios. E, claro, pelos espanhóis. Ao menos até os 12 minutos do segundo tempo da prorrogação da final da Copa de 2010, no Soccer City, em Johanesurgo. Quando Andrés Iniesta recebeu a bola do armador Cesc Fábregas e bateu cruzado para o fundo da meta do goleiro holandês Stekelenburg. Fazendo justiça ao melhor time entre os finalistas. À melhor seleção do mundo desde fevereiro de 2007. Equipe que havia vencido 49 dos 54 jogos desde então. Perdido apenas dois deles. O último na estreia de uma das piores Copas de todos os tempos e campos. Aquela que levou o treinador do Manchester United, o escocês Alex Ferguson, a declarar que os últimos seis Mundiais haviam sido tão emocionantes quanto uma “tarde no dentista”.

Depois da derrota inicial contra a neutra e anódina Suíça, a Espanha não mais se perdeu. Achou merecidas vitórias mesmo com o pior ataque de um campeão mundial desde 1930, com apenas oito gols em sete jogos. Reencontrou aos poucos seu jogo de técnica, velocidade na troca de passes, posse de bola exacerbada durante a Copa. Tudo aquilo que demonstrou em 90 minutos irrepreensíveis contra a renovada Alemanha, na semifinal. Quando manteve a pelota lá na frente, com qualidade, intensidade e inteligência, no estilo de jogo por eles apelidado de “tikitaka”.

Fala Carlos Alberto Parreira:

- Eles triangulam demais, trocam passes em profusão. Os meias Xavi e Iniesta penetram muito na área rival, estão sempre todos muito pertos uns dos outros com a bola. A Espanha acaba criando espaços porque sempre têm quatro jogadores dando opções de ataque. Sem a bola, eles se defendem de forma compacta, e fora da grande área, encurtando o espaço dos rivais.

Tudo que fizeram contra a Alemanha. Quando o time espanhol abusou do que havia de melhor na Espanha – ou melhor, na Catalunha: a manutenção da base vencedora de tudo pelo Barcelona do treinador Pep Guardiola: os zagueiros Gerard Piqué e Carles Puyol, o volante Sergio Busquets, os armadores todocampistas Xavi Hernández e Iniesta, e o ponta Pedro Rodríguez jogam e treinam juntos há anos.

Não por acaso dão certo no clube e na seleção. Fora Iniesta e Pedro, todos catalães. Mesmo os que chegaram meninos às canteras do Barcelona (as divisões de base do clube) cresceram na sede de La Masía como se tivessem coração blaugrana (azul-grená, em catalão). Em 2007, o clube e Iniesta recusaram quase 50 milhões de euros ofertados pelo rival Real Madrid: “Falo com o coração. Meu desejo é passar a minha vida inteira no Barcelona”. Falou e jogou Iniesta.

O fenômeno tem sido raro neste mundo globalizado e pulverizado. Não é só a fidelidade por um clube (ou, no caso, no lema barcelonista, “mais que um clube”). Ainda mais raro é um time servir de base para uma seleção. Prática mais comum até os anos 1970. Como foi a grande Alemanha que venceu uma enorme Holanda, a Laranja Mecânica da primeira Copa em campos alemães. O goleiraço Maier, o eficiente zagueiro-direito Schwarzenbeck, o líbero dos líberos Beckenbauer, o espetacular lateral-esquerdo Breitner, o todocampista Hoeness, e o bomber Gerd Muller. Seis titulares de Helmut Schön em 1974 formavam a base do Bayern de Munique tricampeão europeu de clubes, de 1974 a 1976.

Entrosamento que ajudou demais a Itália a superar uma primeira fase medíocre e bater os favoritos Brasil, Argentina e Alemanha, na Copa na Espanha, em 1982. Com o imenso Zoff na meta, o nada Gentile na marcação individual, o soberbo Scirea na sobra, o excelente Cabrini na lateral-esquerda, o meio-campista Tardelli marcando e armando na intermediária, com Paolo sendo a arma Rossi nas três partidas decisivas. Seis campeões da Juventus.

Base também da Itália campeã pela primeira vez, em 1934, com cinco titulares da Vecchia Signora. Entre eles o goleiro e capitão Combi, os meio-campistas de qualidade Monti (argentino de nascimento) e Ferrari, e o ponta-esquerda Orsi. O Uruguai do Maracanazo de 1950 aprontou a única derrota irreversível do futebol com cinco jogadores do Peñarol. Entre eles, o ótimo goleiro Maspoli, el capitán e centro-médio Obdulo Varela, o craque do time (o armador Schiaffino), e o ponta-direita que, você sabe... Ghiggia. Aquele. Foi um time histórico em 1950 porque havia anos treinava e jogava junto pelo Peñarol. Não era acaso. Como também não era por fortuna que o Brasil de Flávio Costa também brilhou até o primeiro tempo do jogo decisivo de 1950. Era um senhor time formado a partir da base do Expresso da Vitória vascaíno. Barbosa, Augusto, Danilo Alvim, Ademir de Menezes e Chico eram Vasco naquele, bem, você sabe...

Outra seleção que aprontou zebra histórica em Copas também se baseava num só time: a Alemanha que virou para cima da mágica Hungria de 1954, no Milagre de Berna, era montada a partir de três da turma de trás do Kaiserslautern, mais os irmãos Ottmar e Fritz Walter. Time modesto que, talvez, tenha se superado não apenas pela tenacidade alemã. Também pela formação de um espírito desenvolvido dentro do Kaiserslautern, duas vezes campeão alemão e duas vezes vice, entre 1951 e 1955.

O Brasil também teve uma senhora base que orbitava ao redor de estrelas campeãs do mundo quatro anos antes. A Seleção foi bi no Chile em 1962 com cinco titulares botafoguenses: Nilton Santos, Didi, Garrincha, Amarildo e Zagallo. Quatro deles entre os 14 campeões mundiais de 1958 que permaneceram entre os 22 convocados. Grupo composto por atletas de apenas sete clubes brasileiros: sete do Santos campeoníssimo de Pelé; os cinco alvinegros cariocas da turma de Mané; mais três do Fluminense, três do Palmeiras, dois do São Paulo, um da Portuguesa, e ouro do Bangu.

Realidade oposta ao pentacampeão mundial, 40 anos depois, em 2002. Na família de Scolari, eram 11 titulares de 11 times diferentes, que jogavam em cinco países. Ao todo, os 23 convocados pertenciam a 17 clubes distintos. Ainda assim, em um mês, jogaram um futebol pouco babélico. Mas não de babar. Porque não há como dar tanta liga com tanta gente com domicílios futebolísticos distantes.

Um dos milagres espanhóis em 2010 foi unificar o jogo num país usualmente separado por questões muito além do campo esportivo. Mais uma lição que o gol de Iniesta deixa não apenas para o mundo futebolístico. Quem sabe, para cada espanhol.

AMANHÃ TEM MAIS DA PRÉ-COPA DE 2010 DA PREPARAÇÃO DA ESPANHA

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