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Futebol Brasileiro

Sobrevivendo FC: se vira, jogador!

Como atletas de clubes menores e jogadoras do futebol feminino sobrevivem com o agravamento da crise financeira causada pelo novo coronavírus

Sobrevivendo FC: se vira, jogador!
Sobrevivendo FC: se vira, jogador!

Por Bruno Formiga e Taynah Espinoza

O novo coronavírus paralisou o futebol brasileiro. E com ele suspendeu temporariamente a carreira e o sonho de milhares de jogadores e jogadoras. A esmagadora maioria desses, por sinal, formada por trabalhadores com salário mínimo. Ou seja: sem partidas, e por vezes sem estrutura para se manter, muitos precisaram usar a quarentena para se reinventar (e se sustentar) longe dos campos.

De acordo com o último levantamento da CBF, o Brasil tem mais de 700 clubes profissionais. Um mercado gigante e que não vive apenas de holofotes e Série A. O grosso dessa classe é feito de equipes com pouco investimento e que lutam pra sobreviver – assim como os atletas.

Apesar de a imagem do jogador ser normalmente ligada a fama e fortuna, 82% dos atletas profissionais brasileiros ganham apenas um salário mínimo. E somente 0,83% dos atletas, os que jogam nas grandes equipes, ganham mais de R$ 50 mil. Os números são da Pluri Consultoria.

No futebol feminino o cenário é ainda pior.

Bem pior.

Ano passado, para ser ter uma ideia, apenas oito dos 52 times registrados no Campeonato Brasileiro Feminino tinham no elenco a maioria das jogadoras registradas com carteira assinada.

A realidade é formada muito mais por promessas de vitrine e oportunidades do que de fato dinheiro no bolso e remuneração. Esperança em troca de rendimento em alto nível.

Assim, o coronavírus atingiu em cheio os jogadores e jogadoras, já tão acostumados a não receberem salários em dia – e muitas vezes nem receber. Sem jogos e sem renda, os clubes perderam dinheiro e ganharam dívidas. Vários negociaram redução com jogadores. Mas tem muito jogador que não tem pra onde reduzir.

E são essas histórias que vamos contar.

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Vaquinha para pagar pensão

Neste momento de dificuldade, a solidariedade é mais do que necessária. Madison, atacante do Macaé, contou justamente com isso para conseguir pagar a pensão do filho de 11 anos. O jogador não recebe salário desde março. Mas as contas continuam chegando.

Pra mim está sendo difícil pois eu tenho um filho de 11 anos e pago pensão. E estou com um recém-nascido em casa, que é bastante complicado, pois só tenho essa renda para manter minha família, que é o futebol”, disse o atleta.

Madison contou com vaquinha dos companheiros de Macaé para pagar pensão do filho. Foto: Arquivo pessoal
Madison contou com vaquinha dos companheiros de Macaé para pagar pensão do filho. Foto: Arquivo pessoal

Madison tem dez anos de carreira. Sempre jogou em clubes menores, como o Serra, Tupy, Real Noroeste e Rio Branco por exemplo. Clubes pequenos significam salários menores também. Isso quando ele tinha contrato o ano todo. “Teve ano que só consegui jogar nos primeiros 6 meses. Agora, de uns 4 anos pra cá, já consegui me firmar o ano todo de contrato” lembrou o jogador.

Natural do Espírito Santo, o atacante voltou pra terra natal quando o campeonato carioca foi paralisado, em março. Seu contrato com o Macaé acabou dia 14 de maio, mas ele deve retornar ao clube para jogar o fim do Estadual. Enquanto o calendário do futebol está parado, Madison pensou em trabalhar em outra área pra conseguir se manter, mas como mora em Santa Leopoldina, uma cidade pequena do Espírito Santo, a oferta de emprego também é escassa.

Futebol feminino: um jogo por um prato de comida. E quando não tem jogo?

No futebol feminino, o problema é muito pior. Precisar de ajuda financeira ou trabalhar em outra área é comum pras meninas mesmo quando o calendário caminha tranquilamente. “A realidade no Nordeste é a seguinte: muitas jogadoras jogando em troca de um prato de comida, em busca de um sonho”, revela Ligia Montalvão, capitã do Santos Dumont, da Série A2 do Brasileirão Feminino.

Lígia denunciou o clube por não repassar às atletas a verba que a CBF destinou para as equipes durante a pandemia do novo coronavírus. A Confederação Brasileira de Futebol anunciou um repasse de R$19,12 milhões a clubes e federações. Deste valor, R$1,8 milhão foi aos times da Série A2 feminina, o que significa R$50 mil na mão dos dirigentes.

“Como o valor entra na conta do clube, só quem tem acesso é o tesoureiro e o presidente. E é a mesma coisa o presidente e o tesoureiro. É uma pessoa só. Ele disse que só pagaria R$500. Esse valor era referente a duas folhas salariais. Então, se desse R$500, seria R$250 por mês. Falei 'de jeito nenhum. Como você recebe 50 mil e você quer pagar 500 reais?'. Aí bati o pé. Queria R$1.500, mas aí a gente negociou e fechou em R$1.000”, contou Lígia.

Lígia: “A realidade no Nordeste é a seguinte: muitas jogadoras jogando em troca de um prato de comida, em busca de um sonho”. Foto: arquivo pessoal
Lígia: “A realidade no Nordeste é a seguinte: muitas jogadoras jogando em troca de um prato de comida, em busca de um sonho”. Foto: arquivo pessoal

Como o clube tem 25 jogadoras e cinco pessoas na comissão técnica, dos R$50 mil repassados pela CBF ao clube, apenas R$30mil foram, de fato, utilizados para pagar salários. A grande maioria das jogadoras do clube é de família muito humilde e só passaria a receber algum dinheiro do Santos Dumont se o time avançasse à próxima fase. A desvalorização do futebol feminino faz com que grande parte das atletas esteja passando por dificuldade financeira agora. “Infelizmente, estranho é quem não passa por isso”, lamenta Lígia.

Fome de oportunidade!

A pausa no futebol foi ainda mais cruel com sonhos em recuperação. Carlos Fernando sofreu uma lesão de ligamento no joelho há dez meses. De lá pra cá, passou por cirurgia e mais de seis meses de fisioterapia. Sem clube, recorreu ao Sindicato dos Atletas de Futebol do Estado do Rio Janeiro (Saferj). E quando estava quase pronto pra voltar tudo parou.

O lateral-esquerdo de 26 anos sempre teve jornada dupla. Já passou por Resende, Rubro Curicica e Juventus. Mas sempre trabalhando por fora. Sem time, e sem renda extra do futebol na quarentena, Carlos Fernando intensificou o corre: entrega como motoboy e professor de treinamento funcional perto de casa.

Carlos Fernando trabalha como motoboy e professor de funcional para ter uma renda durante este período. Foto: arquivo pessoal
Carlos Fernando trabalha como motoboy e professor de funcional para ter uma renda durante este período. Foto: arquivo pessoal

Entre uma entrega e outro pelos aplicativos de entrega de comida, Carlos Fernando alimenta a vontade de deixar o que ele mesmo chama de “o Rio que só mata” e ajudar a família.

O dinheiro das aulas de funcional eu guardo pra comprar material de treino e pagar as passagens. Compro suplemento também pra me manter bem. (...) E uso também pra ajudar a minha mãe em caso. Tenho quatro irmãos e uma sobrinha. Moramos todos juntos”.

Durante a pausa, Carlos Fernando faz tudo isso e ainda treina por conta própria em dois períodos: alterna entre o Aterro do Flamengo e um campinho de terra na vizinhança. Sozinho, mas nunca desanimado. No meio da quarentena, pintou uma chance em um time da Série B2 do Rio de Janeiro. Equivale à terceira divisão estadual. O contrato ainda não foi assinado. Mas o coração está cheio de esperança. De novo.

Pausa para... estudar!

Muniz é o capitão da Portuguesa-RJ e referência do time. Cria do Vasco, o volante já rodou um bocado. Passou por Bangu, América e Olaria. Aos 30 anos, projeta atuar mais uns cinco. E a quarentena serviu para reforçar algo que ele já vinha fazendo: se preparar para a vida após a bola.

“Eu não fiz muita coisa nessa quarentena. Mantive os treinamentos em casa. A única coisa que faço de diferente é estudar”, explica. Muniz está no sexto período de Educação Física e já fez também um curso de Gestão de Futebol. A previsão para se formar é no primeiro semestre de 2021.

Alguns jogadores, como Muniz, aproveitaram a pausa pra voltar a estudar. Foto: arquivo pessoal
Alguns jogadores, como Muniz, aproveitaram a pausa pra voltar a estudar. Foto: arquivo pessoal

Sem jogos, o volante intensificou o estudo (em tempos normais, fazia o esquema semipresencial duas vezes por semana) e teve ainda mais certeza da segurança que precisa ter quando parar. Uma segurança que o futebol dificilmente dá.

"Essa pandemia fez com que todos refletissem sobre a aquilo que realmente é importante. Não se trata só de carreira e de futebol”, diz o jogador, que quer continuar no meio quando parar.

Jonathan, goleiro do Macaé, também aproveitou para estudar. Como jogou durante quase dez anos no Madureira, conseguiu cursar Fisioterapia neste período. Ainda falta um ano pra ele concluir a graduação. “Acabei trancando a faculdade para ir morar em Macaé e tentei voltar quando ficou tudo parado, mas não consegui. Tenho lido bastante minhas matérias antigas”, afirma o jogador.

A escolha de Sananduva, do Cascavel, foi por um curso numa área diferente e completamente online. Com salário reduzido desde março, o volante optou por tentar entender um pouco mais o mercado financeiro. “Fiz um mini curso sobre “Trader” para entender um pouco mais sobre finanças e ações, que acho algo bastante interessante”, pontua o atleta. Mas além de estudar, ele conseguiu também ficar um pouco mais próximo da família, num sítio, em Santa Catarina. E com uma missão: a colheita. “No momento estava em época de colheita, então ajudei meu pai a colher a soja”.

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